Histórias de Dona Guiomar
escritas por Nereide S. Santa Rosa
Agosto17, 2001
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Em
tempos de clonagem, um pouco de medicina popular...
Uma
das notícias mais interessantes e, por que não dizer, preocupantes, desta
semana foi o anúncio da clonagem humana. Impressionante. Um assunto polêmico,
que merece uma reflexão séria e filosófica...Imaginem só, clones de nós
mesmos...Pense nisso, você gostaria de ter um clone de si mesmo? Do seu
vizinho? E do seu inimigo?
Na
verdade, essa é uma notícia inevitável de acordo com a evolução cientifica
a que estamos observando nestes últimos anos. Genoma, cirurgia a laser,
laparoscopia, robótica são termos já integrados em nosso dia a dia...
Tudo
isso chama minha atenção e me faz refletir sobre a medicina a que tínhamos
acesso em minha juventude, lá pela década de 20 (do século XX, só para
esclarecer).
Pois
é... Fica difícil e até mesmo complicado encontrarmos um elo entre o que nos
era oferecido naquele tempo e o que hoje dispomos na medicina...Imaginem que, na
minha infância, não existiam os antibióticos...No máximo tínhamos a sulfa
que era o recurso utilizado para as infecções...E quantas pessoas faleciam!
Quantas crianças e amigos...
Meu
pai, por exemplo, quase faleceu quando, em 1918, pegou a terrível gripe
espanhola que dizimou várias pessoas aqui mesmo em São Paulo...Seu tratamento
se limitou a tomar aspirina e fazer escalda-pés! Meu irmão, na década de 50, foi uma das primeiras pessoas a
fazer cirurgia do coração...Mas, infelizmente não existiam todos os recursos
que a medicina hoje dispõe como pontes de safena e coronárias, etc...Ainda
bem, que evoluímos...
Eu
mesmo, em 1939, quase perdi minha filha que contraiu difteria... Se não fosse o
atendimento médico prestativo e dedicado do médico, o pior haveria ocorrido.
Os recursos eram muito escassos e dependíamos totalmente da habilidade dos médicos
de família que eram acionados em extremos casos de necessidade.
Para
suprir essas dificuldades as pessoas utilizavam outros recursos. Era muito
normal que as famílias encontrassem soluções caseiras para resolver seus
problemas de saúde corriqueiros. Desde benzedeiras até os chás e ervas eram
muito utilizados nas casas simples. Uma verdadeira medicina popular... Até
mesmo para uma simples dor de dente: era famoso o lenço colocado em volta do
maxilar para amenizar a dor.
Aqui no Itaim, o Sr João Bauleo, dono de uma chácara de flores na Rua João Cachoeira, era solicitado pelas famílias para benzer as crianças doentes. E não é que passava???
Parece
que está provado que a sugestão e a fé removem montanhas e problemas. Com
certeza acreditar é meio caminho para a cura...
Era
comum, antigamente, as mães zelosas desenvolverem técnicas para atender as
pequenas doenças que eventualmente surgiam em suas crianças. Como por exemplo,
minha mãe que costumava fazer compressas quentes com “papas”de farinha de
linhaça embrulhadas em um pano para serem colocadas nas dores das costas. Ou
então, preparar emplastos feitos com sebo de vela derretido sobre papel de
embrulho para serem colocados no peito das crianças a fim de aliviar a tosse e
a respiração. Colocavam-se pedaços de batata na testa para tirar a dor de
cabeça. O uso do lenço embebido em álcool era comum ao ser colocado em volta
da garganta para amenizar sua dor. Encostar uma faca gelada em qualquer batida
na cabeça resolvia para quem tivesse formado um “galo”. Olhar um fundo de
garrafa servia para passar o terçol dos olhos. Colocar um pano molhado na testa
era solução para quem tivesse febre alta, além de enrolar o corpo em muitos
cobertores. E se faziam muitos chás,
de diferentes tipos: boldo, camomila, cidrão, quebra-pedra preparados como remédio
para dores, cólicas, tonturas, mal-estar, febre, etc.
Essas
soluções geralmente funcionavam...Não posso dizer se por eficiência científica
ou se por crença e fé, mas funcionavam...
Aliás,
naquele tempo eram comuns as simpatias e rezas para resolver esses pequenos
problemas domésticos...Tive a oportunidade de pesquisar algumas delas bem
pitorescas, no livro sobre folclore de Luiz Câmara Cascudo. Transcrevo para seu
divertimento:
“Quem
aponta para as estrelas cria verruga.”
“Para
curar verruga deve-se dizer: Lá vão dois em cima de um, passe a verruga para o
pé de um.”
“Para
curar verruga deve-se esfregá-la na parede de uma igreja onde se entra pela
primeira vez.”
“Para
curar terçol deve-se falar: terçol, terçol, vai para o olho do mais próximo.”
“Passar
a
perna por cima de alguém é condená-la a não crescer mais.”
“Para
curar entorses, a benzedeira deve pegar um novelo de lã e fingir que está
costurando a parte doente enquanto fala: Carne trilhada. Nervo rendido. Osso
torto. Assim mesmo eu coso.Nas horas de Deus E de São Frutuoso.”
“Dizer
que uma ferida está feia, aumenta-lhe o tamanho.”
“Deve-se
cortar o cabelo só na luz nova para fazê-lo crescer.”
“Quando
se tem o pé dormente, manda-se uma pessoa bater nele três vezes, dizendo:
levanta pé, para ir à missa.”
“Quem
tem espinhas no rosto fica curado se as esfregar com um pano ou papel bonito e o
atirar à rua.”
“Para
curar soluço deve-se colocar um algodão molhado na testa.”
Bem,
caros leitores e leitoras...Apesar de estarmos em pleno século XXI, com a
possibilidade de sermos clonados para sempre, essas simpatias são como simples
curiosidade. De certa forma, resgatamos algumas manifestações culturais de
nosso povo. Mas, por favor, não deixem de
consultar os seus médicos de confiança para resolver algumas desses
probleminhas que citamos...
No entanto...Como vocês sabem, “existem mais mistérios entre o céu e a terra, do que possa imaginar nossa vã filosofia...”.
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